NOITE SEM OLHOS
de um cristal com sono esculpi teu beijo
e da fome ancestral da cebola colhi meu riso
estavas num barco sem pétalas só um símbolo
de asas inquietava teu colo na noite sem olhos
e de ti me tomastes pelo avesso
de tua fundura onde um menino dança
de tua flor sem soluços principiei meu sonho
estavas nua e apenas o som te amava
o sol sem ruas esperava o mel de tua pressa
e por aí andavas desde que me viciei em tua ternura
ah flor de saudade água de pássaro com soluços
talvez ainda em mim resista a sombra do teu rastro
escrevi para ti um mar em forma de grito
estava em pleno abraço com o abismo
então chegaram tuas coxas de argila
dois túneis de alasbastro com corcéis famintos
mas não havia para mim senão teus dedos
a pintar de chuva os desvios do coração
não havia cor nesses versos fatigados
de ânsia e de soldados
Então alguém apaixonado plantou um
pouco de música no poema
mas não havia sequer um poema ou lago
era só uma paixão dessas viciadas em pássaros
do mesmo sexo que a música no poema
nenhum mérito de improviso
o amigo põe música no amigo
e apenas por isso a poema existe
nada em si mesmo justifica seus versos
nada só a trama das espadas
nenhuma metáfora que o valha
nenhuma invenção do vazio ou
um arquiteto de plumas
e é tão leve a perfeição que resvala
na primeira falha de tua palavra fria
tão fria que não cabe mais num rio
só sabe perseguir relógios de alma antiga
são parecidos com lágrimas encardidas
dessas com o soluço envelhecido
um dia esperam que o barco engula o nevoeiro
e possam então olhar
e compreender que o cais não tem outra porta
que amanhecer
Geraldo Maia
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